segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Então é Natal

ENTÃO É NATAL

Pe. Mário Fernando Glaab

            Mesmo sendo o Natal a festa mais bonita de todo o ano litúrgico, às vezes fica-se um pouco desnorteado quanto o seu real significado para a caminhada cristã. O Natal se reveste de tantas luzes e de tantas mensagens a tal ponto que a mensagem central perde a centralidade. Tudo fala do Natal, mesmo antes de iniciar o Advento. Os sentimentos das pessoas são desafiados em todos os sentidos, principalmente as emoções. Explora-se muito o aspecto econômico, dando aquela impressão de que é preciso adquirir muitas coisas que irão proporcionar sensação de bem estar e de paz. Dentro desta visão acentua-se em demasia a necessidade de presentear as pessoas que se quer bem. Parece que somente dando presentes, - e presentes de valor! – os amigos são valorizados e os laços de amizade são apertados. O Natal não pode ser Natal se a ceia ou o almoço não for exagerado. Gasta-se muito além do que se pode sem graves conseqüências. Outros ainda fazem viagens que, de uma vez, eliminam o verdadeiro sentido natalino.
            Como pista para uma atitude correta diante do mistério celebrado no Natal, sugerimos a proposta que se encontra na solenidade da Imaculada Conceição. Na leitura do Gênesis (3,10), depois que Adão comera do fruto da árvore e foi chamado por Deus, ele se esconde. Foge do Criador. O ser humano decidiu seguir por outro caminho: errou. É o pecado, a desobediência, o egoísmo. Mesmo estando nu, isto é, não tendo mais nada ao que se apoiar, o homem não é abandonado por Deus. Ele é chamado. O chamado de Deus é revelação do coração de Deus que não se deixa vencer em misericórdia. É o sinal da esperança, ou então, a promessa do Todo-poderoso. No entanto, o homem, fragilizado pelo pecado, precisa que Deus lhe faça as vestes. Adão não tem coragem para se colocar diante do Criador e olhá-Lo de frente. Assim a história do ser humano vai avançando por entre caminhos bastante tortuosos. A esperança, colocada pelo próprio Criador no homem, o faz avançar. Mas, às vezes ele quase esquece por completo dela. Isso o leva para bem longe da meta.
            A resposta se encontra em Lucas 1,38. Quando Deus quis, preparou alguém entre os seres humanos que lhe pudesse responder “sim”, sem fugir. Uma jovem chamada Maria. Deus, para não assustar o ser humano tão pequeno diante de sua grandeza, manifesta-se através do Anjo. Explica os seus planos até onde esta pobre criatura os possa compreender. A resposta que recebe não é a de alguém que entendeu, mas de alguém que creu: “Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!”. Se fôssemos usar critérios humanos, diríamos que essa atitude surpreendeu ao próprio Senhor. Não havia mais dúvidas, Deus encontrou alguém que o “enfrentou”. Já podia vir morar com os humanos: ao menos um entre a humanidade não se escondia em seu egoísmo: “E o Verbo se fez carne e veio morar entre nós” (Jo 1,14).
            Acolher, viver e testemunhar o Natal do Senhor, mais do que se preocupar com muitas coisas, é colocar-se na atitude de Maria. Isso não implica em grandes projetos pastorais, enormes planejamentos, grandes obras, mas sim, num profundo ato de fé. Fé em Deus que também hoje pode e quer vir morar conosco. Morar entre os humanos de nossos dias que estão tão ocupados com as suas atividades, com o mundo que se agita cada vez mais. Acreditar que Deus ainda pode fazer maravilhas. A fé, todavia, para ser autêntica, como a de Maria, não pode ficar somente na primeira parte; ela implica compromisso: “faça-se!”. Olhar para Deus que se revela tão humanamente em Jesus Cristo e dizer-lhe “sim” é, no mínimo, colocar-se ao lado dele lá onde Ele está: entre os mais humildes das criaturas. Com eles irá aprender o que significa tomar a cruz de todos os dias e seguir o Salvador. Entre eles o “faça-se” transformar-se-á em vida cristã. E o Natal terá atingido o seu significado: “então é Natal!”.

Diálogo

SE SOUBÉSSEMOS DIALOGAR
Pe. Mário Fernando Glaab
            Alguém, após uma explanação catequética sobre os mandamentos, pergunta: “por que a Igreja é contra tantas coisas que para a maioria das pessoas não são ruins?” Outra pessoa constata que muitas vezes, na Igreja, idéias e concepções particulares são apresentadas como ensinamentos oficiais, isso quando não são impostas. O que pode haver por trás disso tudo? Será que é e deve ser assim mesmo?
            Em primeiro lugar é bom lembrar que a Igreja nunca pode ser “contra”, mas sempre “a favor”. Em segundo lugar, imposições de pontos de vista ferem a dignidade do ser humano. Nem mesmo os ensinamentos oficiais podem ser impostos, muito menos, idéias ou concepções, que são apenas instrumentos particulares que nunca podem ocupar o lugar da verdade.
            O que carece de fato, nesses casos, não é capacidade intelectual para compreender, mas a humilde disposição para o diálogo sincero. Somente através do diálogo é que se estabelecem compreensões entre os seres humanos. Monólogos não levam à compreensão, apenas passam, quando muito, informações que, conforme o caso, são somadas e acumuladas. Mudam a quantidade, mas não a qualidade do receptor, e somente dele; o emissor não é mudado. Diálogo, ao invés, é bem mais do que palavras jogadas ao vento ou que se cruzam sem produzir efeitos. Diálogo é compartilha. Dar do que se tem e receber daquilo que o outro possui. Quando se estabelece diálogo entre dois interlocutores, tanto um como o outro doam e recebem ao mesmo tempo. Os dois são transformados qualitativamente. Isso é, são enriquecidos de fato. Mas para que isso aconteça é preciso abertura ao diferente, ao que pensa diferente. Quem parte do princípio de que ele sabe e o outro não, nunca pode participar de um verdadeiro diálogo. Infelizmente entre nós, também entre os cristãos, o diálogo não é tão comum. Quase sempre estamos convencidos de que precisamos e devemos ensinar, somente; dificilmente admitimos a necessidade do aprendizado.
            E o que tem haver diálogo com a “Igreja do contra” ou com a “Igreja a favor”? Ao se afirmar que a Igreja é sempre “a favor” quer se mostrar que tudo o que é bom para o ser humano, assim como para todo o criado, é defendido pela Igreja. Isso porque, como o seu Mestre, ela tem como meta a instauração do Reino de Deus já neste mundo, mesmo ciente de que a plenitude depende do “dia do Senhor”. Dele ela é sinal. O Reino de Deus é a realização plena da criação. Isso quer dizer que tudo o que leva à plenitude é buscado pela Igreja. Diríamos, seguindo o linguajar ecológico, que a Igreja sempre é a favor da vida de todas as criaturas. Ela nunca pode ser contra aquilo que verdadeiramente colabora para que haja mais vida. Todas as manifestações de vida são valorizadas, mesmo as das criaturas mais humildes e ocultas. É o positivo que lhe interessa. Diálogo é justamente isso: todos têm vez e voz. Ninguém sabe tudo, ninguém é excluído como não prestável para nada. Ser “contra” é atitude de não dar chances para ouvir (diálogo). Corta-se a possibilidade dialogal antes de começar. Seria o mesmo que dizer “não tenho nada a aprender com você! Você para mim não é!”.
            As questões que mais afligem as pessoas em nossos dias estão relacionadas com perguntas concretas sobre o que se pode ou não se pode fazer, se é moralmente bom ou não. Aí entram as questões éticas relacionadas com a vida (bioética). Geralmente as perguntas dependem da maneira como são formuladas, por exemplo: a Igreja permite o uso de anticoncepcionais? Permite a manipulação de embriões, permite o aborto, o casamento gay etc.? Dessa forma cerceia-se a resposta ao “sim” e ao “não”. E o “não” justifica o “contra”. Em um diálogo sincero pode-se, no entanto, chegar a concluir que tanto o que pergunta quanto o que responde, estão buscando soluções para melhor viver. A confusão, então, deve estar no que entendem por melhor viver. Os objetos das perguntas devem ser analisados antes de qualquer tentativa de resposta. O que de fato se quer quando se procede usando anticoncepcionais, manipulando embriões ou praticando aborto? Esses procedimentos são valores que enriquecem a toda a criação ou fecham seus autores egoisticamente, no afã de alcançar mais prazer, mais poder, mais ter? No diálogo franco entre a Igreja e o ser humano de hoje é mister mostrar que sempre se deve estar a favor da vida para todos. Dos que questionam, mas também dos que não podem questionar. Também eles precisam ser “ouvidos” e deles se precisa aprender. A Igreja sempre quer aprender e compartilhar com o mundo para que tudo o que for bom possa florescer e dar frutos. Ser do contra nunca justifica; mas somente ser a favor daquilo que é verdadeiramente humano. No diálogo todos podem aprender a se colocar em sintonia com o que ajuda a todos, superando egoísmos que somente empobrecem e destroem.
            Nada de imposição! Sempre proposta, diálogo, compreensão, colaboração e enriquecimento mútuo.